terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Miguel Sousa Tavares descobre o incendiário

Miguel Sousa Tavares (extracto)

com o guerrilheiro Bruno de Carvalho à cabeça. E, então, de que se queixam eles, desta vez?
Não, com certeza dos descontos dados por Manuel Mota, no Porto- Marítimo, pois que ainda há dias se queixavam de só terem tido direito a 4 minutos de descontos na Amoreira. Não, certamente, do penalty que qualificou o FC Porto ao minuto 95, pois esse não vi ninguém que o tenha contestado (apesar de, obviamente, não coincidir com o “intensómetro” de Bruno de Carvalho). Em comparação com o penalty que deu o 3-1 ao Sporting em Penafiel – filho da velha escola leonina dos penalties à Manuel Fernandes e João Pinto, que consiste em adiantar a bola ao defesa e ficar à espera da perna dele para se fazer auto-rasteirar – o penalty do Dragãofoi tão menos espectacular quanto mais sério. E, nem vale a pena comparar o de Penafiel com os dois perdoados ao Sporting no jogo com o Marítimo em Alvalade (nem haveria peixeirada alguma se eles têm sido assinalados). Assim, resta ao Sporting queixar-se de o jogo do Dragão ter começado minutos mais tarde do que o de Penafiel e ter acabado 4 minutos mais tarde.
3 – Bruno de Carvalho (leia-se Sporting) um plano para reformulação, ou moralização ou qualquer coisa em …ão, do futebol português. Do que li, o dito plano parece-me pensado pela rama: um conjunto de banalidades e lugares-comuns, já muitas vezes ditas por outros e nunca suficientemente meditadas, além de lacunas evidentes e gritantes. Uma coisa para marcar terreno e reunir em Alvalade 22 súbditos atraídos pela possibilidade de mais dinheiro a cair do céu, dando em troca ao presidente sportinguista um estatuto ficcional de “líder do futebol português” que ele afanosamente busca. Faz-me lembrar o que se contava na Faculdade de Direito que teria sido dito pelo Prof. Marcelo Caetano sobret a tese de doutoramento do Prof. Soares Martinez: “Tem partes boas e partes originais. Infelizmente, as partes boas não são originais e as originais não são boas”.
Entre outras evidências, a regeneradora doutrina Bruno de Carvalho não podia falhar a defesa da profissionalização dos árbitros, cujos fundamentos estão longe de ser consensuais, arriscando sim tornar-se uma armadilha bem pior (um árbitro que depende inteiramente do futebol para viver está muito mais indefeso e à mercê de várias influências e constrangimentos). Mas também defende o “sorteio puro” dos árbitros, um disparate que não é praticado em lado algum e competição alguma – é como se o Eduardo Barroso, no serviço que dirige, sorteasse os médicos para as intervenções cirúrgicas. Mas quando o sportinguista e presidente da Comissão de Arbitragem, Vítor Pereira, se atreveu a criticar o “plano”, dizendo que ele em nada contribuía para a melhoria da arbitragem e do futebol português, Bruno de Carvalho explodiu de raiva, como só um presidente de um clube de cavalheiros se permite fazer.
E vá de meter cá fora o Dazibao nr. 8/14 (e 42ºda sua presidência), onde acusa Vítor Pereira de “cobardia e falta de interesse em alterar o que está mal no futebol português”. Sim, porque, tendo o Sporting recebido um mandado divino para dizer o que está mal no futebol português e mandar alterar o que entender, só os cobardes ou malandros, coniventes com o mal, é que não marcham atrás, entusiasmadamente. Ser um clube de cavalheiros confere privilégios destes.
4 – Não vou discutir mais uma vez o Apito Dourado, agora com o Eduardo Barroso. Mas sempre lhe digo que não esperava vê-lo argumentar à Rui Gomes da Silva,
esse instigador profissional do ódio. Repito que o Apito Dourado foi investigado e julgado por 17 magistrados judiciais e do Ministério Público e apenas um magistrado do MP, obrigado a tal pela Dr.ª Maria José Morgado, se atreveu a deduzir acusação, escudado no precioso testemunho de Carolina Salgado, e tendo recebido do tribunal uma sentença tão devastadora e humilhante que eu recomendo vivamente ao Eduardo Barroso que a leia – se, de facto, quer saber o que foi o Apito Dourado, se que saber como é que foi montado e planeado e se quer decifrar o mistério inicial de entender porque razão apenas o FC Porto e o Boavista foram alvos de investigação. Eu sei que dá trabalho e exige conhecimentos que, em grande parte, lhe são estranhos, embora não incompreensíveis, Mas se me viessem dizer que o Eduardo Barroso não percebe nada de transplantes de fígado, por mais corrosiva e fundamentada que me pudesse parecer a acusação, eu não me atreveria a dar-lhe crédito e, muito menos, a pronunciar-me sobre ela.
Não, eu não ouvi as escutas – estas ou quaisquer outras, porque sei bem do que se trata e como se usam. Quer saber se eu acredito que a “fruta” não eram meninas para o árbitro? Não, não acredito.
Mas sei (note: sei) que todos os clubes faziam isso com os árbitros que o pediam. O que a justiça, desportiva e judicial, teria de provar era a existência de um nexo de causalidade entre isso e o resultado de um jogo – e foi isso que não foi capaz de fazer. Eu percebo a dificuldade em entender a importância do sacana do nexo da causalidade, mas aceito a facilidade de conclusões dos leigos: também não sei dizer a diferença entre um apêndice e um duodeno, mas, por isso mesmo, não tiro conclusões por conveniência. Em matéria de certezas, o que sei é que houve um clube cujo vice-presidente foi apanhado a transferir dinheiro para a conta de um árbitro que iria dirigir um jogo seu e sem conhecimento deste, a fim de depois, não gostando da arbitragem, o clube poder vir dizer que o árbitro fora comprado. Aconteceu há dois anos atrás e com o Sporting.
O caso, sem precedentes conhecidos, está agora para ser julgado na justiça comum, mas nenhum processo foi aberto ao Sportinga na justiça desportiva – tão diligente contra o FC Porto no Apito Dourado, que até o queria mandar para a segunda divisão. Dir-me-á o Eduardo Barroso que o Sporting não pode ser responsabilizado pela actuação de um seu dirigente. Não? Não era disso que se tratava no Apito Dourado?
Querem moralizar o futebol português? Eu também tenho algumas ideias sobre o assunto – não sei é se coincidem com as vossas. Porque, não sei porquê, desconfio que a vossa moralização consiste apenas em impedir que o FC Porto possa continuar a ganhar tanto como o tem feito nestes últimos trinta anos

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