Extracto da crónica de Miguel Sousa Tavares de ontem 11/03/20
em A Bola
...FC Porto- Rio Ave. A menos de meia hora do fim, com o
jogo empatado, apenas um lance poderia e deveria ter perturbado o seu tranquilo
final de dia na Cidade do Futebol: Uma jogada em que Marega entrou na área e já
dentro dela (disso não havia dúvidas), rematou à baliza, sendo uns frames depois ou em simultâneo, atingido
a pontapé por um adversário quando a bola já lá não estava (disso também não
havia lugar a dúvidas) . Uma daquelas jogadas em que estamos constantemente a
ouvir os entendidos na matéria a comentar: “chegou tarde e atingiu só o pé do
adversário. Falta e cartão amarelo”. Penálti, pois. Mas o VAS manteve-se
impávido na sua poltrona, dando mais um gole na sua Cola e mordiscando a sanduíche.
Nem ele nem o “melhor árbitro português” (que não passa um jogo sem uma falha
grave e contra o FC Porto nunca vê penáltis por si só) viram ali sombra de
infracção. Os únicos em Portugal inteiro.
(Mas faça-se um parêntesis para relembrar que este VAR era o mesmo VAS que na semana anterior assinalara dois penáltis a favor do Benfica contra o Moreirense. E, sim, ah, também não me esqueço, deixara escapar um terceiro por uma pisadela no Dyego Sousa. Porém, com um detalhe: este, da pisadela, só se via em muito lenta câmara e, se assinalado, ter-se-ia seguido aos outros dois – e estes, de mais do que duvidosa existência. Teriam sido três no mesmo jogo, a resolver assim o que o Benfica nunca se mostrou capaz de resolver de outra forma. Um registo quase calaboteiro.)
Retomemos então o filme imaginado da tarde da tarde domingueira do VAS. O jogo aproximava-se do final, mas, a menos de dez minutos do fim, acabou-se o merecido repouso do VAR. Sérgio Oliveira remata de longe, o Keeper do Rio Ave defende para a frente, Soares recarga ainda de fora da área e o guarda-redes volta a defender como pode, até que Marega faz a terceira recarga e a bola acaba por entrar, embrulhada entre um defesa e o guardião dos vila-condenses. Era, enfim, o fruto colhido de tanto esforço para chegar ao golo, os três pontos, a vitória alcançada a ferros, talvez até um campeonato decidido após tudo ter parecido já perdido, Os jogadores do Porto – os do relvado e os do banco – abraçam-se num cacho, e não foi com os cotovelos; 40.000 pularam como um só nas bancadas; centenas de milhar mais beijaram os televisores em casa e seis milhões de benfiquistas desataram a vociferar insultos a Bruno Lage e Luís Filipe Vieira. Nem um jogador do Rio Ave esboçou a sombra de uma protesto e o melhor árbitro português, que remédio, apontou para o centro e para lá se dirigiu. Mas foi então que o VAS despertou do seu remanso, pousou a segunda sanduíche e a Coca Cola e soprou ao microfone de Soares Dias : – Espera aí Artur, deixa-me ver isto com atenção.
*(acho que, ninguém me convence do contrário, que Vasco Santos foi influenciado pelos comentários do comentador da SportTV que na altura, antes da decisão do VAR repetiu o lance 2 ou 3 vezes na televisão e sentenciou: “a haver fora de jogo é à pele”).
E começou. Começou à procura de qualquer coisa que pudesse servir para anular o golo. Não porque parecesse evidente ou provável que a houvesse, mas porque sim.
Para começar, o remate final, o golo: nada por ali. Depois, o primeiro remate, o início da jogada: ainda menos. Ah, alto, temos aqui o segundo remate, será que não descubro o Soares em fora-de-jogo? Ora, deixa cá ver, onde é que eu ponho a linha? Vamos ao manual, que isto é complicado. E o VAS vai ao manual, o célebre “Protocolo”, que serve para tudo, sobretudo para que nada seja claro para quem vê futebol. Conclui que há variadíssimas possibilidades: cabeça, ombros, tronco, ancas, perna, pé. OK, diz para consigo, qualquer coisa serve. Agora, segunda dificuldade: quando é que ponho a linha? A questão é decisiva, sabendo nós que um frame atrás ou à frente pode significar uma diferença de até 13 cms. E durante todo o tempo em que o pé de Sérgio Oliveira está em contacto com a bola para efectuar o primeiro remate passam vários frames e segundos, durante os quais Soares tanto pode ter estado atrasado, como em linha, como adiantado. Tudo dependeria, afinal, de onde o VAS resolvesse traçar a linha do offside. Isto, claro, desde que ele tivesse recusado, como recusou, a única atitude sensata e de acordo com as recomendações do Board da FIFA de, na dúvida, favorecer o golo. Mas ele não estava lá para isso: – Artur, é offside. Por 3 cms.
E recostou-se para trás. Não só tinha acabado de anular um golo limpo à vista de todos. Não só tinha falsificado o resultado de um jogo tal como visto por todos. Com a sua obsessão em procurar agulha em palheiro, tinha gasto nisso 6’ 20” – um tempo preciosos para quebrar o ritmo aos jogadores do Porto e proporcionar aos do Rio Ave um retemperar de forças, física e anímicas, para defenderem o empate até final. Talvez tenha também ajudado decisivamente a decidir o campeonato a favor do Benfica e só por isso o seu nome não será esquecido. Mas espero também que a prestação deste VAS sirva para matar este VAR, antes que ele mate o futebol. 40.000 pessoas que pagam bilhete e que se dão ao trabalho de ir a um estádio e centenas de milhar de outras que pagam uma assinatura para ver jogos na TV, e que todas vêm um golo completamente limpo e um desfecho justo de um jogo, não podem estar à mercê de um único ser que, refastelado numa poltrona, gasta seis minutos à procura de uma irregularidade que ninguém viu para contrariar e evidência daquilo que todos viram. Eu, que nunca tive qualquer entusiasmo pela introdução do VAR, antes pelo contrário, confirmo as minhas piores suspeitas: em lugar de servir apenas para corrogir erros grosseiros, tem servido sobretudo para introduzir outra instância de critério, igualmente subjectivo, de julgamento. Só que menos compreensível, menos legítima e, logo, menos desculpável.
2 – E já que vou com a corda toda, não me afasto do tema da arbitragem, pois que, infelizmente, ela vai decidir este campeonato. Quero falar do penálti que deu o golo que valeu o empate ao Benfica em Setúbal, e que toda a gente considerou pacífico. Eu não considero. Por uma razão de facto e duas razões de direito, ou, melhor dizendo, duas dúvidas, que muito gostaria de ver esclarecidas por quem sabe mais do que eu – nomeadamente Duarte Gomes (Carlos Duarte um perito em arbitragem muito mais credível), cuja opinião sempre respeitei, mesmo não concordando.
A razão de facto é que o penálti nasce de um canto assinalado contra o Setúbal, por suposto cabeceamento de um jogador do Vitória pela linha de fundo. O árbitro João Pinheiro, que esteve sempre pronto a, na dúvida, assinalar tudo a favor do Benfica, marcou pontapé de canto, mas as imagens mostram bem que o jogador sadino apenas tocou na bola de raspão com os cabelos – e não me parece que os cabelos tenham força para desviar a trajectória de uma bola de futebol.
A primeira questão de direito também é de facto: ao segundo poste, está um jogador sadino de costas que não vê Rúben Dias vir sobre ele. É claro nas imagens que Rúben Dias vai deliberadamente contra o jogador adversário, procurando o contacto, e que só então é que este, num gesto instintivo, levanta o cotovelo, atingindo o jogador benfiquista. A falta é do jogador do vitória ou é primeiro do jogador do Benfica ou, sendo provocada por este , não é de nenhum?
Mais importante do que isto, admitindo que houve falta do defensor, ela acontece a uns dez metros de distância do local onde a bola estava e onde foi disputada. Poder-se-ia argumentar que a suposta falta teria impedido Rúben Dias de eventualmente disputar o lance, mas também isso não vale, pois a bola não foi parar ali nem nunca iria para ali, visto que foi logo cortada ao primeiro poste por outro defensor do Vitória. Ao mesmo tempo que Rúben Dias caía ao chão na zona do segundo poste, a bola estava a ser cortada na zona do primeiro poste a uns metros dali: o que se passou num lado não teve nada a ver com o que se passou no outro, nem directa, nem indirectamente. Se a jogada tem acontecido no meio-campo o árbitro interrompia para marcar falta? E até que distância – dez, vinte, cinquenta metros? Responda quem sabe. Para fazer doutrina. Ah, mas o Benfica teve sorte: para si, o VAR estava mais do que atento...
(Mas faça-se um parêntesis para relembrar que este VAR era o mesmo VAS que na semana anterior assinalara dois penáltis a favor do Benfica contra o Moreirense. E, sim, ah, também não me esqueço, deixara escapar um terceiro por uma pisadela no Dyego Sousa. Porém, com um detalhe: este, da pisadela, só se via em muito lenta câmara e, se assinalado, ter-se-ia seguido aos outros dois – e estes, de mais do que duvidosa existência. Teriam sido três no mesmo jogo, a resolver assim o que o Benfica nunca se mostrou capaz de resolver de outra forma. Um registo quase calaboteiro.)
Retomemos então o filme imaginado da tarde da tarde domingueira do VAS. O jogo aproximava-se do final, mas, a menos de dez minutos do fim, acabou-se o merecido repouso do VAR. Sérgio Oliveira remata de longe, o Keeper do Rio Ave defende para a frente, Soares recarga ainda de fora da área e o guarda-redes volta a defender como pode, até que Marega faz a terceira recarga e a bola acaba por entrar, embrulhada entre um defesa e o guardião dos vila-condenses. Era, enfim, o fruto colhido de tanto esforço para chegar ao golo, os três pontos, a vitória alcançada a ferros, talvez até um campeonato decidido após tudo ter parecido já perdido, Os jogadores do Porto – os do relvado e os do banco – abraçam-se num cacho, e não foi com os cotovelos; 40.000 pularam como um só nas bancadas; centenas de milhar mais beijaram os televisores em casa e seis milhões de benfiquistas desataram a vociferar insultos a Bruno Lage e Luís Filipe Vieira. Nem um jogador do Rio Ave esboçou a sombra de uma protesto e o melhor árbitro português, que remédio, apontou para o centro e para lá se dirigiu. Mas foi então que o VAS despertou do seu remanso, pousou a segunda sanduíche e a Coca Cola e soprou ao microfone de Soares Dias : – Espera aí Artur, deixa-me ver isto com atenção.
*(acho que, ninguém me convence do contrário, que Vasco Santos foi influenciado pelos comentários do comentador da SportTV que na altura, antes da decisão do VAR repetiu o lance 2 ou 3 vezes na televisão e sentenciou: “a haver fora de jogo é à pele”).
E começou. Começou à procura de qualquer coisa que pudesse servir para anular o golo. Não porque parecesse evidente ou provável que a houvesse, mas porque sim.
Para começar, o remate final, o golo: nada por ali. Depois, o primeiro remate, o início da jogada: ainda menos. Ah, alto, temos aqui o segundo remate, será que não descubro o Soares em fora-de-jogo? Ora, deixa cá ver, onde é que eu ponho a linha? Vamos ao manual, que isto é complicado. E o VAS vai ao manual, o célebre “Protocolo”, que serve para tudo, sobretudo para que nada seja claro para quem vê futebol. Conclui que há variadíssimas possibilidades: cabeça, ombros, tronco, ancas, perna, pé. OK, diz para consigo, qualquer coisa serve. Agora, segunda dificuldade: quando é que ponho a linha? A questão é decisiva, sabendo nós que um frame atrás ou à frente pode significar uma diferença de até 13 cms. E durante todo o tempo em que o pé de Sérgio Oliveira está em contacto com a bola para efectuar o primeiro remate passam vários frames e segundos, durante os quais Soares tanto pode ter estado atrasado, como em linha, como adiantado. Tudo dependeria, afinal, de onde o VAS resolvesse traçar a linha do offside. Isto, claro, desde que ele tivesse recusado, como recusou, a única atitude sensata e de acordo com as recomendações do Board da FIFA de, na dúvida, favorecer o golo. Mas ele não estava lá para isso: – Artur, é offside. Por 3 cms.
E recostou-se para trás. Não só tinha acabado de anular um golo limpo à vista de todos. Não só tinha falsificado o resultado de um jogo tal como visto por todos. Com a sua obsessão em procurar agulha em palheiro, tinha gasto nisso 6’ 20” – um tempo preciosos para quebrar o ritmo aos jogadores do Porto e proporcionar aos do Rio Ave um retemperar de forças, física e anímicas, para defenderem o empate até final. Talvez tenha também ajudado decisivamente a decidir o campeonato a favor do Benfica e só por isso o seu nome não será esquecido. Mas espero também que a prestação deste VAS sirva para matar este VAR, antes que ele mate o futebol. 40.000 pessoas que pagam bilhete e que se dão ao trabalho de ir a um estádio e centenas de milhar de outras que pagam uma assinatura para ver jogos na TV, e que todas vêm um golo completamente limpo e um desfecho justo de um jogo, não podem estar à mercê de um único ser que, refastelado numa poltrona, gasta seis minutos à procura de uma irregularidade que ninguém viu para contrariar e evidência daquilo que todos viram. Eu, que nunca tive qualquer entusiasmo pela introdução do VAR, antes pelo contrário, confirmo as minhas piores suspeitas: em lugar de servir apenas para corrogir erros grosseiros, tem servido sobretudo para introduzir outra instância de critério, igualmente subjectivo, de julgamento. Só que menos compreensível, menos legítima e, logo, menos desculpável.
2 – E já que vou com a corda toda, não me afasto do tema da arbitragem, pois que, infelizmente, ela vai decidir este campeonato. Quero falar do penálti que deu o golo que valeu o empate ao Benfica em Setúbal, e que toda a gente considerou pacífico. Eu não considero. Por uma razão de facto e duas razões de direito, ou, melhor dizendo, duas dúvidas, que muito gostaria de ver esclarecidas por quem sabe mais do que eu – nomeadamente Duarte Gomes (Carlos Duarte um perito em arbitragem muito mais credível), cuja opinião sempre respeitei, mesmo não concordando.
A razão de facto é que o penálti nasce de um canto assinalado contra o Setúbal, por suposto cabeceamento de um jogador do Vitória pela linha de fundo. O árbitro João Pinheiro, que esteve sempre pronto a, na dúvida, assinalar tudo a favor do Benfica, marcou pontapé de canto, mas as imagens mostram bem que o jogador sadino apenas tocou na bola de raspão com os cabelos – e não me parece que os cabelos tenham força para desviar a trajectória de uma bola de futebol.
A primeira questão de direito também é de facto: ao segundo poste, está um jogador sadino de costas que não vê Rúben Dias vir sobre ele. É claro nas imagens que Rúben Dias vai deliberadamente contra o jogador adversário, procurando o contacto, e que só então é que este, num gesto instintivo, levanta o cotovelo, atingindo o jogador benfiquista. A falta é do jogador do vitória ou é primeiro do jogador do Benfica ou, sendo provocada por este , não é de nenhum?
Mais importante do que isto, admitindo que houve falta do defensor, ela acontece a uns dez metros de distância do local onde a bola estava e onde foi disputada. Poder-se-ia argumentar que a suposta falta teria impedido Rúben Dias de eventualmente disputar o lance, mas também isso não vale, pois a bola não foi parar ali nem nunca iria para ali, visto que foi logo cortada ao primeiro poste por outro defensor do Vitória. Ao mesmo tempo que Rúben Dias caía ao chão na zona do segundo poste, a bola estava a ser cortada na zona do primeiro poste a uns metros dali: o que se passou num lado não teve nada a ver com o que se passou no outro, nem directa, nem indirectamente. Se a jogada tem acontecido no meio-campo o árbitro interrompia para marcar falta? E até que distância – dez, vinte, cinquenta metros? Responda quem sabe. Para fazer doutrina. Ah, mas o Benfica teve sorte: para si, o VAR estava mais do que atento...
* - Meu aparte
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