"Futebol é espectáculo e criatividade, mas também é organização, critério e eficácia. Organização não quer dizer tédio, mas sim disciplina, inteligência, pensamento e conhecimento". A definição é de André Villas-Boas e foi escrita pela mão do próprio nas páginas de O JOGO. Há algo de comum em quase todos os testemunhos que se recolhem junto de quem privou com o novo treinador do FC Porto: gosta de viver, falar e pensar futebol. É um apaixonado pelo jogo e, mesmo que faça questão de sublinhar frequentemente que não vive exclusivamente para ele, não resiste a discuti-lo, a analisá-lo e a decompô-lo com a minúcia de um relojoeiro sempre que a oportunidade se proporciona. O JOGO proporcionou-lhe a oportunidade duas vezes: no Mundial de 2006 e no Europeu de 2008 André Villas-Boas foi nosso colunista e foi nestas páginas que desvendou um pouco da sua personalidade e dos seus conceitos sobre futebol, numa altura em que a carreira de treinador principal ainda era apenas uma intenção. Conceitos como o da importância do treino. "Quando o processo de treino é orientado de maneira correcta e quando a essência do treino é o jogo, no próprio jogo as vitórias acontecem e até parecem fáceis. Depois introduzimos o lado estratégico e específico dessa partida e "afinamos" a equipa para surpreender o adversário", escreveu em 2008, revelando parte do seu método de trabalho e acrescentando que "é importante que os jogadores saibam onde podem criar mais dano e por essa razão a preparação dum jogo tem de ser levada duma forma séria, racional e com total concentração de todos". Ora, o perfeccionismo no treino e a minúcia na preparação dos jogos são precisamente duas das qualidades que lhe atribuem os jogadores que trabalharam com ele. De resto, também revelou nestas páginas algumas diferenças em relação aos conceitos defendidos, entre outros, por Jesualdo Ferreira para o futebol de ataque. Onde uns defendem as transições rápidas, Villas-Boas fala em "organização, criatividade, posse e verticalidade" apesar de admitir que "no futebol há muitas maneiras de se chegar ao sucesso". "Pode ser-se um bom líder e um mau treinador e vencer e pode até ser-se um mau treinador e um péssimo líder e contudo fazer alguma coisa. O que é difícil é ser-se constantemente vencedor. Para se chegar lá é preciso classe, organização, competência e, por vezes, nem isso é suficiente" sublinhava em 2008, muito antes de se adivinhar ao leme do FC Porto. O que já adivinhava, mesmo nessa altura, eram as dificuldades que esperam qualquer treinador de futebol e falava da necessidade de ter... coragem. "Pede-se sucesso instantâneo mas dá-se pouco tempo de vida ao treinador. As exigências são máximas e tudo é criticado, os riscos que se correm são grandes e, portanto, o medo de inovar é enorme. Resumindo, é preciso ter mesmo muita muita coragem". Uma coragem que vai ter o seu primeiro teste de fogo esta tarde, pelas 13 horas, quando André Villas-Boas enfrentar a sua primeira conferência de Imprensa como treinador do FC Porto. Jorge Maia n'OJOGO
Stop aos malabarismos nas alas - Apesar da maior parte dos conceitos revelados por André Villas-Boas nas crónicas escritas para O JOGO serem mais ou menos genéricos, o técnico revelou algumas ideias curiosas sobre posições específicas. Os alas, por exemplo, merecem-lhe uma atenção particular. "Não há nada mais fascinante do que os duelos entre alas e laterais adversários. Normalmente, o objectivo destes duelos é ter produto final, é ser capaz de passar pelo adversário e encontrar um colega em posição de finalização na grande área, ou então mudar de direcção e vir para dentro rematar. O que não interessa são os malabarismos excessivos. Não interessa parar em frente ao adversário e usar uma parafrenália de adjectivos que lhe dão mais tempo para se recompor, tentar o corte ou pôr a cobertura em posição. Menos interesse têm os malabarismos se apesar de se ter passado pelo adversário e pela sua cobertura, o cruzamento sai para trás da baliza ou o remate é bloqueado porque o defesa teve tempo de reajustar o seu posicionamento". À atenção de Hulk e Varela...
Defesas Laterais que se complementam - A tendência ofensiva dos laterais e a capacidade que têm para projectar o jogo ofensivo da equipa em profundidade é um dos aspectos mais discutido do futebol actual. André Villas-Boas tem uma visão muito própria sobre o funcionamento ideal desses elementos, pensando os dois em conjunto enquanto peças do bloco defensivo e não como elementos independentes entre si. Nesse sentido, o técnico defende que se privilegie o ataque por um dos lados evitando o risco de desequilíbrios que poderiam resultar do adiantamento de ambos em simultâneo. "O futebol moderno permite constatar dois tipos de comportamentos diferentes nos laterias. Uns, como Bosingwa ou Lahm, estão virados para a profundidade e outros como Paulo Ferreira ou Ooijer garantem o equilíbrio e jogam mais a partir da posição. Normalmente, os dois tipos, os mais posicionais e os mais agressivos, coexistem na mesma equipa, privilegiando-se um dos lados de forma mais agressiva. O risco de projectar os dois ao mesmo tempo no futebol actual é bastante elevado, principalmente quando os adversários, através do estudo antecipado, percebem que podem ter por aí uma saída em transição ofensiva". Para o bloco de notas de Álvaro Pereira.
Trinco com dinâmica ofensiva - Vilas-Boas tem uma visão muito particular sobre o papel do "pivô defensivo" ou "trinco" Para o novo técnico do FC Porto, é fundamental conseguir tirar o "defensivo" ao pivô, atribuindo-lhe maiores responsabilidades ofensivas. "Um dos dilemas com que se deparam os treinadores que jogam com pivôs defensivos é a liberdade concedida a esse jogador em posse de bola. O ideal será que ele jogue vertical e horizontalmente, que não só divida o jogo de um lado para o outro do campo, mas que tenha a dinâmica para penetrar ou a visão para encontrar o passe de penetração. Depois, em organização defensiva, tem de ser capaz de cobrir os outros dois médios, compensar um lateral subido e ditar momentos de pressão em transição defensiva. O que se pretende é atribuir-lhe mais liberdade de penetração e torná-lo mentalmente mais agressivo. Para isso é preciso mexer na organização defensiva da equipa e criar mecanismos de compensação, é preciso ter coragem, assumir riscos e ser mais ofensivo". Fernando fica avisado.
O que escreveu André Villas-Boas nas páginas de O JOGO - Definição de futebol - "Futebol é espectáculo e criatividade, mas também é organização, critério e eficácia. Organização não quer dizer tédio, mas sim disciplina, inteligência, pensamento e conhecimento.
Contrariar defesas zonais - "Em equipas que defendem dessa maneira, a melhor forma de ter sucesso é tentar colocar a bola entre o primeiro e o segundo homem zonal. O importante é que se crie a dúvida sobre quem tem de atacar a bola. Outro truque é fazer o canto curto e arrastar logo dois jogadores
Auxiliares de arbitragem - "O estado da arbitragem em alta competição é gravíssimo. Os responsáveis que impedem a introdução dos meios audiovisuais como auxílio aos àrbitros devem pensar duas vezes porque sustentar as desculpas no erro humano já não é credível quando esses erros acontecem em catadupa
Processo de treino - "Quando o processo de treino é orientado de maneira correcta e quando a essência do treino é o jogo, no próprio jogo as vitórias acontecem e até chegam a parecer fáceis. Depois, introduzimos o lado estratégico e específico dessa partida e "afinamos" a equipa
A vertente estratégica - "No futebol actual, a estratégia tem um papel fundamental. É importante que os jogadores saibam onde podem criar mais dano e, por essa razão, a preparação de um jogo tem de ser levada de forma séria, racional e com total concentração de todos
O sucesso e os falsos profetas - "No futebol há muitas maneiras de se chegar ao sucesso. Pode ser-se um bom líder e mau treinador e vencer e pode até ser-se um mau treinador e um péssimo líder e ainda assim conseguir fazer alguma coisa. O que é muito difícil é ser-se constantemente vencedor (de competições, entenda-se). Para se chegar lá, é preciso classe, organização e competência e por vezes, nem isso é suficiente. São poucos os que vencem e ainda menos os que se conseguem manter na rota do sucesso. Mas, há custa dos que chegam ao sucesso inesperado, temos visto todo o tipo de ideias de quinta categoria ser vendidas como o modelo a seguir
Exigência e superação - "Pede-se aos treinadores de futebol sucesso instantâneo, mas dá-se pouco tempo de vida aos técnicos. As exigências são máximas e tudo é criticado. Os riscos que se correm são grandes e, portanto, o medo de inovar é enorme. Resumindo, é preciso ter mesmo muita, muita coragem...
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