16/12/2014 - Excerto da crónica de Miguel Sousa Tavares
... As estatísticas ajudam-nos a perceber o que foi um jogo – é essa a utilidade delas ou, de outro modo, nem faria sentido que fossem usadas. E as estatísticas do Dragão dizem-nos que, além de menos posse de bola, o Benfica teve um canto contra seis, fez 18 ataques contra 28, rematou 6 vezes contra 17, cometeu 28 faltas contra 18, viu duas bolas de golo do adversário esbarrarem na trave e um golo anulado ao adversário numa decisão que tanto podia ser essa como ter sido a oposta. Ou seja, jogou sempre recuado à defesa, como jogaria um Moreirense ou uma Académica no Dragão, mas muito menos aberto e perigoso do que, por exemplo, um Rio Ave ali jogou.
Porque ganhou, então? Fundamentalmente, porque teve uma sorte que não costuma acontecer assim, sempre para o mesmo lado.
Sorte na maneira como evita a derrota, sobrevivendo a dois lances de golo desperdiçados pelo FC Porto ainda com 0-0, e depois como evita o relançamento do jogo com duas bolas na barra. E sorte na maneira como garante a vitória, com dois golos nas duas únicas oportunidades de que dispôs em todo o jogo e que, na verdade, nem sequer são verdadeiras oportunidades. A segunda é uma bola suicidariamente largada por Fabiano para a frente, num remate sem perigo especial, e que, por sorte, encontrou Lima a passar por ali, sem ninguém ao pé. O primeiro é um golo caricato, mas que, há que reconhecê-lo, é talvez a mais genial contribuição de Jorge Jesus para a estratégia dos jogos – de tal maneira já se tornou numa imagem de marca desta equipa. Os longos lançamentos laterais de Maxi Pereira, fazendo a bola cair na área como que vinda do céu, têm realmente o condão de estabelecer o pânico lá dentro, criando um problema aos defesas para o qual eles não estão preparados: é tão eficaz como anedótico. Mas, neste caso, o lançamento para o golo de anca teve a prestimosa ajuda do árbitro Jorge Sousa – o tal árbitro com o qual, segundo garantiu Silvio Cervan, era rigorosamente impossível ao Benfica ganhar o jogo.
Afinal, sucedeu o contrário: a sua contribuição para o primeiro golo, que viria a marcar o resto do jogo, foi determinante. Ao contrário do que sucedeu em todos os outros lançamentos laterais ao longo da partida, só os dois efectuados por Maxi na lateral da área portista mereceram a Jorge de Sousa um tamanho zelo proteccionista que até estendeu os dois metros de distância da lei para uns quatro ou cinco – uma diferença que fez toda a diferença.
Assim, pois, gostaria que alguém explicasse melhor em que consistiu a tal aula táctica dada pelo Benfica. Atacou ou contra-atacou bem? Quando, lembram-se de alguma jogada? Defendeu bem? Sim, se esse era o objectivo principal e se acharmos normal ver Talisca, Enzo, Gaitan, Salvio e mesmo Lima passarem 80 minutos do jogo em tarefas defensivas, sempre atrás da linha do meio-campo. Mas mesmo assim, defendeu-se bem só quando Herrera não chutou para fora uma bola de golo feito, quando Júlio César não roubou um golo a Jackson ou as traves não lhe roubaram dois. E só na justa medida em que Samaris e Jardel puderam abusar livremente do jogo sistematicamente faltoso. Mas que assim se ganham campeonatos, infelizmente não tenho dívidas.
2 Mas também o FC Porto esteve bastante aquém do que já jogou e do que esta equipa de luxo justifica e exige.
E, dêem-se as voltas que se derem, é preocupante que tenha perdido os dois derbies que teve no Dragão: não basta jogar mais, é preciso saber ganhar. Brahimi confirmou que desapareceu algures, de onde tarda a regressar; Herrera confirmou aquilo que já escrevi algumas vezes: faz um jogo bom em cada três e dificilmente se entende que tenha lugar cativo; e Indi sobre a direita dos centrais, sem pé direito para sair a jogar, é o regresso às penosas e perigosas saídas de bola, nas quais, além do resto, se perdem minutos preciosos e se enerva estupidamente a equipa e a plateia. E não percebi, francamente, a saída de Tello em lugar de Brahimi e a ideia de os trocar de lado, quando desde o primeiro minuto se percebeu que Tello ia infernizar a vida a André Almeida.
3 E, mais uma vez, peço que registem que se disputou novo jogo de alto risco no Dragão sem que, antes, durante ou depois, e por palavras, por actos ou atitudes, tenha havido o mais pequeno incidente atribuível às cores portistas. Perdemos, mas não desligamos a luz nem passamos a regar a relva, não mandamos cadeiras para o relvado nem as culpas para cima do árbitro. (dragaoatento: o qual na minha opinião teve importante influência)
E não mandamos nenhum esquadrão de camisas negras, organizado e armado para aterrorizar os adeptos adversários e a quem depois são imputadas acusações iguais aos que apenas se defenderam (estou a falar do Porto-Sporting, para o campeonato do ano passado).
4 Vi a segunda parte do Sporting-Moreirense: os da casa não criaram uma só oportunidade além do golo miraculoso aos 94 minutos, antecedido por uma escandalosa perdida para o 0-2. Rezam as crónicas que, para não variar, os adeptos, o treinador e o presidente viraram-se contra o árbitro, responsabilizando-o pela derrota (empate 1-1)
Mas também rezam as crónicas que os únicos erros do árbitro foram perdoar um penalty e perdoar uma expulsão ao Sporting. Nada de novo, por aquelas bandas.
5 Afastado da Taça e com o campeonato seriamente comprometido, a aposta na Champions é, à vista, a mais sólida perspectiva de o FC Porto evitar uma época completamente decepcionante. E a verdade é que depois de um sorteio altamente favorável na fase de grupos, seguiu-se agora um sorteio de encomenda para os oitavos de final. O Basileia, de Paulo Sousa, não sendo favas contadas, é seguramente a mais acessível de todas as outras sete equipas que poderiam ter saído em sorte. É preciso merecer essa sorte. Começando por não perder até lá mais nenhum ponto no campeonato e esperar, talvez, que o Maxi Pereira tenha uma entorse no braço lançador, que faz dele um potencial grande jogadores de basebol.
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